Imagine estar em tribunal a ser despejado e, de repente, largar uma bomba: “Tenho hipersensibilidade eletromagnética, sou alérgica ao Wi-Fi!” Parece tirado de um guião de ficção científica, mas aconteceu mesmo, e está a deixar milhares de pessoas a questionar: será esta “doença” real ou puro delírio moderno?
Um vídeo viral do YouTube, filmado em Detroit (Parte 1) (Parte 2), apanhou um momento insólito. Um juiz, visivelmente paciente, ouve uma inquilina alegar que não pode pagar renda devido a… uma condição médica rara que a impede de viver perto de qualquer tipo de tecnologia sem fios.
“Tenho três incapacidades funcionais e hipersensibilidade eletromagnética. Sou incompatível com contadores inteligentes, Wi-Fi, torres de telecomunicações…”
Esta mulher afirma que só conseguiu viver na casa em causa após os senhorios aceitarem instalar contadores alternativos e filtros em todas as tomadas, entre outras alterações mirabolantes para eliminar as temidas frequências eletromagnéticas.
Mas… será isto possível? Estará o Wi-Fi a adoecer pessoas em silêncio? Ou será apenas mais uma teoria da conspiração digna de um chapéu de alumínio?
O Que É, Afinal, a Hipersensibilidade Eletromagnética (EHS)?
De acordo com os seus defensores, EHS (Electromagnetic Hypersensitivity) é uma condição debilitante provocada pela exposição a redes Wi-Fi, telemóveis, micro-ondas, e basicamente tudo o que envolva campos eletromagnéticos (EMFs). Os sintomas? Vão desde dores de cabeça, náuseas e fadiga, até problemas de memória, irritações cutâneas e palpitações cardíacas.
Em casos extremos, algumas pessoas dizem ser obrigadas a viver em zonas remotas ou até construir autênticas “gaiolas de Faraday” nas suas casas. A mulher do vídeo acima diz mesmo que vai mudar-se para uma zona rural para escapar ao “inferno eletromagnético”.
Curiosamente, apareceu em tribunal via Zoom. Ligada por cabo Ethernet? Talvez. Mas… e aquele monitor brilhante mesmo à sua frente?
A Organização Mundial da Saúde Já Se Pronunciou
A própria Organização Mundial da Saúde (OMS) tem uma página dedicada ao tema, onde afirma que:
“A EHS é caracterizada por uma variedade de sintomas não específicos que os indivíduos atribuem à exposição a campos eletromagnéticos. Contudo, este conjunto de sintomas não pertence a nenhuma síndrome médica reconhecida.”
O Caso Trágico de Jenny Fry – A História Que Abalou o Reino Unido
Um dos casos mais dramáticos associados à EHS é o da jovem britânica Jenny Fry, de apenas 15 anos, que tirou a própria vida em 2015. Os pais culparam o Wi-Fi da escola pelo sofrimento insuportável da filha. Esta tragédia foi amplamente divulgada em comunidades online que acreditam firmemente nesta condição. Mas atenção: correlação não é causação.
O Que Diz a Ciência? A Verdade Chocante Revelada
Aqui é onde tudo muda. Cientistas de várias partes do mundo têm vindo a investigar a fundo a alegada EHS. O método é simples: colocar pessoas que dizem sofrer de EHS num ambiente controlado e verificar se conseguem detetar a presença de campos eletromagnéticos… sem saberem se esses campos estão ativos ou não.
Os resultados? Demolidores.
Um estudo meta-analítico de 2010, publicado na Bioelectromagnetics, analisou 46 testes cegos com 1.175 participantes que afirmavam sofrer de EHS. O que se descobriu foi que:
Nenhuma evidência sólida foi encontrada para provar que os campos eletromagnéticos causam os sintomas. No entanto, ficou claro que o efeito nocebo (quando o medo provoca sintomas reais) desempenha um papel significativo.
Em termos simples: quando as pessoas não sabem se o Wi-Fi está ligado ou desligado, os sintomas desaparecem como que por magia.
O Efeito Nocebo – A Psicologia do Medo Invisível
O que é o efeito nocebo? É o oposto do placebo. É quando alguém acredita tão fortemente que algo lhe vai fazer mal… que acaba por realmente sentir sintomas. Assim, dizer repetidamente a alguém que “o Wi-Fi faz mal à saúde” pode, em certos indivíduos, causar dores, enjoos e até ansiedade — mesmo que o router esteja desligado.
Tem Hipersensibilidade Eletromagnética? Aqui Está a Verdade Que Ninguém Quer Dizer
Más notícias (ou talvez boas?): não, você não tem EHS. Porque, de acordo com todas as evidências científicas disponíveis… ela simplesmente não existe.
Claro, isto não significa que os sintomas não sejam reais para quem os sente. A dor é real, mesmo que a causa esteja mal diagnosticada. A história trágica de Jenny Fry mostra que problemas mentais ou emocionais podem estar a ser mal interpretados como reações a tecnologia.
A abordagem correta? Empatia e ciência. Encaminhar essas pessoas para exames médicos e acompanhamento psicológico, em vez de reforçar crenças infundadas, pode salvar vidas.
Conclusão: A “Alergia ao Wi-Fi” é Real? Ou Apenas Mais Um Mito Urbano Digital?
A hipersensibilidade eletromagnética é um fenómeno fascinante que mistura medo, desinformação e o enorme poder do cérebro humano. Numa era onde vivemos rodeados de tecnologia, é natural que surjam teorias a tentar explicar sintomas vagos. Mas a verdade científica é clara: não há qualquer prova de que o Wi-Fi esteja a adoecer as pessoas.
Então, da próxima vez que ouvir alguém dizer que sente náuseas por causa do router… talvez o problema não esteja nas ondas, mas sim nas ideias.