No dia 22 de novembro de 2023, a Broadcom concluiu a aquisição da VMware. E, em menos de um mês, os clientes já sentiram o aperto no pescoço.
Mas esta não é uma surpresa. A Broadcom tem um histórico de agir como um autêntico fundo de private equity disfarçado de empresa de tecnologia. Seu modus operandi é claro: cortar postos de trabalho, reduzir investimentos em pesquisa e desenvolvimento, minimizar o suporte ao cliente e inflacionar os preços para recuperar o investimento feito. Empresas como CA Technologies e Symantec já sentiram o peso desse “manual de aquisição destrutiva”. Ironicamente, a CA, que outrora era temida pelo seu relacionamento hostil com os clientes, acabou por ser vítima desse mesmo comportamento.
Nos últimos anos, a Broadcom deixou de ser uma mera fabricante de chips para se transformar numa máquina de aquisições impulsionada por engenharia financeira. Como um artigo da SeekingAlpha descreveu, a Broadcom é “nada mais do que uma história de engenharia financeira baseada em fusões e aquisições”. Com o seu crescimento no setor de semicondutores a atingir um limite, a solução encontrada foi adquirir empresas a torto e a direito.
Um executivo do setor de private equity descreveu a aquisição da CA em 2018 como “a mais bizarra, desorientada e não estratégica dos últimos dez anos”. E parece que a Broadcom está a seguir essa mesma cartilha com a VMware. Depois de sua tentativa frustrada de adquirir a Qualcomm, bloqueada pelo governo dos EUA, a empresa tem agido como um comprador compulsivo com um cartão de crédito sem limite.
Mas o que CA, Symantec e VMware têm em comum? Praticamente nada. A CA foca-se em produtos empresariais para mainframes, a Symantec em soluções de segurança para grandes empresas, PMEs e utilizadores domésticos, enquanto a VMware se posiciona no setor de virtualização. Apesar de haver alguma sobreposição na base de clientes, os produtos dessas empresas são soluções individuais e não um portefólio coerente de serviços integrados.
VMware Declara Guerra aos Seus Clientes
Antes da conclusão da aquisição, o presidente da VMware, Sumit Dhawan, garantiu que a Broadcom não planeava “ajustes significativos na estratégia de portefólio de produtos”.
Essa declaração envelheceu mal. Muito mal.
Em dezembro do mesmo ano, Broadcom anunciou:
- Uma redução brutal de 50% no quadro de funcionários da VMware;
- O fim das licenças perpétuas, obrigando todos os utilizadores a aderirem a um modelo de subscrição;
- Uma reestruturação dos produtos em pacotes obrigatórios, forçando as empresas a adquirirem “bundles” de serviços desnecessários, tal como um pacote de TV por cabo;
- Uma forte redução do programa de parceiros e revendedores.
Na prática, a VMware passou de uma estratégia de inovação para uma de pura monetização. O objetivo não é mais oferecer novas funcionalidades que conquistem clientes, mas sim espremer ao máximo a base existente antes que esta fuja para concorrentes. O pensamento estratégico dentro da VMware não é “como podemos oferecer soluções inovadoras e manter nossos clientes felizes?”, mas sim “como podemos manipular as licenças e a estrutura de preços para aprisionar os utilizadores pelo maior tempo possível?”.
E isso leva-nos às reveladoras informações publicadas pelo The Register:
Em um e-mail obtido pelo The Register, um distribuidor francês da VMware informou que, a partir de 10 de abril, “o número mínimo de ‘cores’ necessário para as licenças VMware aumentará substancialmente, de 16 para 72 por linha de comando”.
Ou seja, se uma empresa possuir um servidor com apenas um processador de oito ‘cores’, será forçada a pagar por 72 ‘cores’ – ou seja, 64 ‘cores’ que nunca irá usar. Um verdadeiro assalto a céu aberto.
E não para por aí. Também foi revelado que clientes que não renovarem suas subscrições anuais a tempo serão penalizados com uma sobretaxa de 20%. E o pior: a assinatura mínima passa a ser de três anos!
Segundo um revendedor da VMware que preferiu permanecer anônimo:
“A VMware está a punir as pequenas e médias empresas que ainda dependem da plataforma. A mensagem é clara: a VMware não valoriza o mercado de PMEs que ajudou a construir seu império.”
Outro CEO do setor reforçou essa ideia:
“A Broadcom tem uma estratégia bem definida: focar-se nos 20% maiores clientes e abandonar o mercado de PMEs. Esta é uma tática comprovada: reduzir custos operacionais, fechar contratos multianuais a preços exorbitantes e maximizar margens de lucro. Mas no final do dia, não passa de um jogo de manipulação financeira.”
E assim se confirma: a VMware deixou de ser uma empresa de inovação para se transformar numa simples ferramenta de extorsão empresarial. A grande questão agora é: quanto tempo os clientes estarão dispostos a suportar esta nova realidade antes de abandonarem o barco?